Os Jogos Paralímpicos de Paris, que ocorrerão logo após as Olimpíadas, entre 28 de agosto e 8 de setembro, contarão com a maior delegação brasileira em uma edição realizada no exterior, composta por 276 competidores. Quatro desses atletas, que embarcam esta semana para competirem, utilizam as instalações do Complexo Esportivo da Escola Nacional de Administração Pública (Enap), que há mais de 30 anos serve de base para a preparação de atletas paralímpicos em diversas modalidades.
Entre as atletas e os atletas convocados, está Ana Paula Marques, 42, que competirá no halterofilismo na categoria até 61 kg. Ana Paula se tornou pessoa com deficiência aos 20 anos, após ser vítima de uma tentativa de feminicídio. Ela iniciou na vela adaptada e migrou para o halterofilismo em 2015, modalidade em que agora representará o Brasil pela primeira vez em uma edição dos Jogos Paralímpicos.
Ana Paula utiliza o espaço esportivo da Enap desde 2014. Naquela época, ela praticava outros esportes, mas foi no ano seguinte que se firmou no halterofilismo. “A Escola abriu as portas para o Cetefe e para nós, atletas. Ter um lugar bem equipado e adaptado para nos receber, além de profissionais disponíveis para nos treinar, faz toda a diferença para alcançarmos o patamar mais alto em uma competição. Por isso, dia 18 de agosto embarcarei em busca de uma medalha para o Brasil”, afirma.
Luciano Reinaldo, que garantiu vaga no tiro com arco na categoria Recurvo Open masculino, também se destaca. Nascido com mielomeningocele, o atleta já representou o Brasil nos Jogos Paralímpicos do Rio 2016, onde alcançou a quarta colocação, o melhor resultado de um brasileiro na modalidade. Ele utiliza as instalações da Enap há quinze anos e ressalta que toda a estrutura da Escola contribui significativamente para as pessoas com deficiência e para os atletas. “A idade chegou, mas, mesmo assim, quero fazer o melhor possível. Assim como foi uma surpresa ficar em quarto no Rio de Janeiro, acredito e espero entregar um bom desempenho”, ressalta.
Outro nome de destaque é Daniele Torres, 31, atleta de parabadminton. Daniele contraiu uma infecção hospitalar ao nascer, que causou paraplegia. Iniciou no parabadminton em 2012, e desde então, coleciona conquistas como o ouro no simples feminino e a prata nas duplas femininas WH1-WH2 nos Jogos Parapan-Americanos de Santiago 2023, além de uma série de outras medalhas. Daniele, que treina na Enap há mais de dez anos, é a primeira mulher a representar o parabadminton nas Paralimpíadas.
O paraibano Ariosvaldo Fernandes, 47, mais conhecido como Parré, contraiu poliomielite aos 18 meses de idade, resultando na paralisia de seus membros inferiores. Medalhista no Mundial de Atletismo em Kobe, no Japão, ele agora se apresenta como uma forte promessa de medalha nas Paralimpíadas de Paris.
Histórico de resultados
A excelência do Complexo Esportivo da Enap e do Cetefe tem se traduzido em resultados expressivos e até em medalha de ouro. Entre as conquistas recentes estão: ouro, prata e bronze na natação nos Jogos Paralímpicos de Tóquio 2020; ouro no tênis em cadeira de rodas e prata no atletismo nos Jogos Pan-Americanos de Toronto 2015; além da prata no Campeonato Mundial de Tiro com Arco (2023).
Parceria com o Cetefe
A parceria da Enap com o Centro de Treinamento de Educação Física Especial (Cetefe) beneficia atualmente mais de 400 atletas, sendo 278 homens e 155 mulheres. “É com grande satisfação, que a gente divulga os(as) beneficiários(as) e comissão técnica da Cetefe convocados(as) para as Paralimpíadas de Paris 2024. Agradecemos o apoio dos nossos parceiros e principalmente da Enap, que ao longo desses anos, nos proporciona a possibilidade de desenvolver a nossa missão e inclusão da pessoa com deficiência através dos nossos programas sociais”, afirma a gestora técnica social da Cetefe, Nathália Cavalcanti.
O complexo esportivo da Enap abriga 17 modalidades, sendo 12 delas paralímpicas: atletismo, bocha, goalball, halterofilismo, judô, natação, parabadminton, tênis em cadeira de rodas, tênis de mesa, tiro com arco, vôlei sentado e rugby em cadeira de rodas. O espaço conta com três quadras profissionais de tênis, já testadas e aprovadas por atletas da modalidade, além de duas quadras de areia para beach tennis, futevôlei e vôlei, uma piscina semiolímpica e um campo de futebol society. O complexo também oferece uma academia de musculação, equipada com mais de 40 aparelhos, professores à disposição para auxiliar os praticantes, além de treinamento funcional e aulas de alongamento.
Para atender a todas as necessidades de preparação da equipe, os atletas convocados para as Paralimpíadas contam com uma comissão técnica composta por dois técnicos e uma fisioterapeuta. “O trabalho que o Cetefe desempenha com pessoas com deficiência é fundamental, desde a base com as crianças até a formação desses atletas. Mas isso só é possível porque estamos dentro do espaço da Enap, que vem fortalecendo e ampliando a acessibilidade e as condições para que possamos desenvolver esse trabalho aqui em Brasília”, destaca a fisioterapeuta Marcia Benetti.
Outro ponto importante levantado pelo técnico da seleção brasileira, Vinícius Cyrillo, é que alguns atletas, ao começarem a treinar pelo Cetefe, acabam mudando de esporte. “Isso acontece justamente devido ao espaço esportivo que a Escola oferece. Como conseguimos abarcar muitas modalidades em um único lugar, os atletas têm a oportunidade de testar diferentes esportes. A partir disso, entra o nosso papel como profissionais em identificar talentos que se destacam mais em um esporte do que em outro”, explica.
O diretor de Gestão Corporativa da Enap, Lincoln Moreira, destacou a importância da parceria da Enap com o Cetefe, que traz diferentes perspectivas: a primeira é o apoio ao patrocínio para o esporte, que já não é fácil de desenvolver no Brasil, independentemente da modalidade. O patrocínio do esporte de alta performance, em particular, exige muita dedicação do atleta e oferece pouco retorno e reconhecimento. Ele mencionou que os atletas precisam atingir um nível de reconhecimento olímpico ou competir em nível mundial para conseguir algum apoio, o que é muito complicado no Brasil. “Nessa parceria legítima e sincera com o Cetefe, a Enap preenche esse espaço, proporcionando mais do que apenas um programa social”, reforça.
A parceria representa um apoio ao esporte brasileiro, especialmente ao paraesporte, o que está diretamente ligado à bandeira da inclusão. Moreira ressaltou também que a deficiência é do tamanho da barreira que a sociedade impõe e se essas barreiras forem derrubadas, a deficiência se torna muito menor. Ele destacou o investimento da Enap em acessibilidade, tecnologias assistivas e mobilidade, mencionando que a Escola foi reformada para permitir a circulação de cadeiras de rodas, e que a instituição não mede esforços para que essas iniciativas continuem acontecendo.
Além do retorno para a sociedade, pelo investimento no esporte e pela inclusão no esporte de alta performance dos atletas paralímpicos, há também um retorno para a própria Enap. Ao compartilhar o complexo esportivo com o Cetefe, a Enap se beneficia com instruções e aulas para os servidores da Escola. Moreira finaliza afirmando que essa parceria proporciona aos servidores um momento de descompressão e qualidade de vida.
Brasil nos Jogos Paralímpicos
Na história dos Jogos Paralímpicos, o Brasil já conquistou 373 medalhas (109 de ouro, 132 de prata e 132 de bronze). Com a participação em Paris 2024, o país está a apenas 27 conquistas de alcançar a marca de 400 pódios. Na última edição, em Tóquio 2020, o Brasil fez sua melhor campanha, com 72 medalhas, sendo 22 de ouro, 20 de prata e 30 de bronze, superando os resultados de Londres 2012.